Do Dream Team ao Redeem Team: Como Jordan e LeBron transformaram o time olímpico dos EUA

Mike DeCourcy

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Mike Krzyzewski estava lá quando Michael Jordan realizou o sonho americano — e quando LeBron James resgatou esse legado. 

E não como mero espectador. O lendário "Coach K", como é conhecido até hoje, era um auxiliar valioso da comissão técnica da seleção dos EUA nos Jogos Olímpicos de Barcelona-1992, quando o Dream Team original — com Jordan, Magic Johnson, Larry Bird e companhia — revolucionou o basquete mundial. Na época, Krzyzewski já acumulava seis participações em Final Four e dois títulos da NCAA.

Anos depois, ele assumiu o comando da equipe que ficou conhecida como "Redeem Team" (Time da Redenção ou Time do Resgate), nos Jogos de Pequim-2008. A missão era clara: recolocar os Estados Unidos no topo do basquete mundial após uma década de decepções.

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Jordan e LeBron, em certo sentido, simbolizam as últimas quatro décadas do basquete masculino americano no cenário internacional. Jordan brilhou como o principal nome do último time composto por universitários a conquistar o ouro olímpico, em Los Angeles-1984, antes de liderar o icônico time de 1992. LeBron, por sua vez, se uniu a Kobe Bryant, Dwyane Wade e Jason Kidd em 2008 para corrigir o rumo após os tropeços pós-Dream Team — e ajudar a construir o sucesso que se mantém até hoje.

— A NBA levou toda a excelência da década anterior, levou sua cultura, para Barcelona, ao representar os EUA pela primeira vez. E foi algo lindo — disse Krzyzewski ao Sporting News. — Fomos liderados por Michael, claro, mas aquele compromisso de todos aqueles caras desencadeou uma explosão... e isso tornou tudo mais difícil para o LeBron. Porque os Ginobilis, os Gasols, que ainda eram garotos naquela época, de repente viraram homens — grandes homens — que queriam ser como o Dream Team.

Michael Jordan

Michael Jordan e o Time dos Sonhos

Um dos mitos mais repetidos da história do esporte é o de que a derrota dos Estados Unidos no basquete nos Jogos Olímpicos de Seul-1988 teria gerado uma revolta tão grande dentro do próprio país que isso levou a NBA a liberar seus jogadores para competir em torneios internacionais e mostrar ao mundo quem realmente mandava.

Mas isso não é verdade. Na verdade, a própria federação de basquete dos EUA votou contra a proposta de permitir a participação de atletas da NBA nos Jogos. A ideia passou porque outras nações, que já estavam começando a ter jogadores no campeonato americano e sabiam que outros viriam, queriam poder escalar seus melhores atletas também.

Quando a nova regra foi aprovada, porém, os EUA aproveitaram ao máximo.

Todos os 11 jogadores ativos da NBA que integraram o time olímpico de 1992 acabaram entrando para o Hall da Fama. Juntos, somam 100 indicações para os times ideais da liga (All-NBA Teams) e 23 títulos de campeão.

Eles ainda precisaram se classificar para Barcelona, disputando o Torneio das Américas em Portland, no Oregon. Venceram seis partidas contra seleções da América do Norte e do Sul com uma média de 51,5 pontos de vantagem. Nos Jogos Olímpicos, venceram oito partidas, de Angola até a final contra a Croácia, com média de 45 pontos de diferença. Nenhum time conseguiu perder por menos de 30 pontos.

A participação do "Dream Team" nem sempre foi uma certeza, mesmo com a aprovação da nova regra. Quando os jogadores da NBA foram liberados, apenas 58% deles declararam interesse em disputar os Jogos. O próprio Michael Jordan estava reticente, mesmo depois de ser indicado por um comitê de peso (que incluía Coach K, C.M. Newton, Chuck Daly e Rod Thorn).

Jordan dizia que já tinha vivido a experiência olímpica em 1984 e buscava uma forma de recusar o convite com elegância. Mas, ao ver quem mais faria parte do elenco, e ao entender a importância do projeto — e da sua presença nele —, acabou topando.

“LeBron jogou várias Olimpíadas e foi importante em todas, mas só existe um verdadeiro Dream Team: o primeiro. Arguivelmente, o time mais talentoso da história do esporte americano”, disse Bob Costas, lendário narrador esportivo, ao Sporting News. “Eles atropelaram todo mundo, e os adversários não se importavam. Estavam honrados de jogar contra aqueles caras. Esse é o impacto que tiveram no jogo.

“Parte disso é mérito da visão do David Stern (ex-comissário da NBA), mas foi o início da expansão global da liga. Hoje, mais de 30% dos atletas da NBA são estrangeiros. Eles abriram esse mercado, tanto de talentos quanto de torcedores”.

A experiência de Jordan em 1984 veio logo após duas décadas complicadas para o basquete dos EUA em Olimpíadas. Em 1972, os americanos foram derrotados pela primeira vez na história, quando a União Soviética teve três chances seguidas para cobrar um lateral nos segundos finais e conseguiu virar o placar. Em 1980, os EUA desistiram dos Jogos de Moscou por causa do boicote liderado por Jimmy Carter. Era um time que teria Isiah Thomas e Mark Aguirre.

Quatro anos depois, em 1984, os soviéticos retribuíram o boicote e não vieram a Los Angeles. Foi a chance de ouro para os EUA vencerem com um time que teve Jordan, Patrick Ewing e Chris Mullin. E que, por inacreditável que pareça, exigiu que todos fizessem testes para conquistar uma vaga — inclusive Charles Barkley, que dominou as seletivas e foi cortado.

“Eu fui assistir aos testes. Tinham 17 mil pessoas no Assembly Hall só para o jogo-treino final antes dos cortes”, contou Fran Fraschilla, hoje analista da ESPN e à época auxiliar na Universidade de Ohio. “Acho que eles ganhariam o ouro mesmo com a União Soviética em quadra. Aquele time dos EUA era muito especial.”

Em 1992, apenas oito anos depois, o Dream Team mudaria para sempre o panorama do basquete mundial. Hoje, com jogadores universitários podendo ganhar dinheiro, é cada vez mais comum ver europeus largando seus clubes para disputar a NCAA. Só Illinois terá quatro deles em 2025-26. Os sete últimos MVPs da NBA nasceram fora dos EUA.

Logo após Barcelona, investimentos e interesse cresceram em países como Espanha, França, Grécia e Alemanha. Nações que deixaram o bloco soviético, como Croácia e Lituânia, viram seus talentos brilharem na NBA. Em 2000, a ideia de que qualquer seleção americana ganharia fácil já estava sob risco: a Lituânia, com Sarunas Jasikevicius no comando, quase eliminou os EUA na semifinal em Sydney.

LeBron se junta à seleção dos Estados Unidos 

Isso ainda não foi suficiente para convencer os americanos de que era preciso mudar a abordagem. A USA Basketball precisou de mais quatro anos para aprender a lição. Em 2002, no Mundial da FIBA disputado em Indianápolis, os EUA foram humilhados com três derrotas e terminaram em um decepcionante sexto lugar. A situação melhorou só um pouco nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, quando boa parte dos principais nomes optou por não jogar e o time que foi à Grécia voltou com apenas a medalha de bronze. LeBron James, recém-saído de uma temporada de calouro espetacular na NBA, topou o desafio aos 19 anos — mas recebeu apenas 11 minutos por jogo do técnico Larry Brown.

“Larry não confiava nele”, contou o experiente jornalista Chris Sheridan, que cobriu diversas Olimpíadas pela Associated Press. “Ele colocava o LeBron atrás do Richard Jefferson na rotação e manteve isso durante toda a competição. O que acontecia era o seguinte: sempre que o LeBron entrava, coisas boas aconteciam. Sempre. Aí o Larry tirava ele, colocava outro no lugar… e o time desandava.”

“Faltou reconhecimento do Larry Brown sobre o que ele tinha nas mãos com LeBron James — e de como estava desperdiçando esse talento. LeBron nunca tinha vindo do banco na vida. Ele aceitou o papel, e até se saiu bem, mas simplesmente não teve tempo de quadra suficiente para ser o diferencial que podia ser.”

Aquilo nunca mais se repetiria — nem com LeBron, nem com o basquete dos Estados Unidos.

Estatísticas Olímpicas
 Michael JordanLeBron James
Jogos1630
Pontos por jogo16.011.9
Rebotes por jogo2.74.5
Assistências por jogo3.44.6
Medalhas de ouro23

Parece mentira que já se passaram 20 anos desde que Jerry Colangelo assumiu a presidência da USA Basketball e escolheu Mike Krzyzewski como técnico da seleção masculina principal. Juntos, eles definiram que LeBron James seria o pilar do projeto que buscava devolver aos Estados Unidos a hegemonia olímpica no basquete.

Mas o início não foi como o planejado. A equipe que viria a ser conhecida como “Redeem Team” — apelido criado pelo jornalista Chris Sheridan, que até hoje se arrepende de não ter registrado a marca — perdeu para a Grécia na semifinal do Mundial de 2006. O time teve enormes dificuldades na defesa do pick-and-roll, algo que Sheridan atribui à resistência dos jogadores em seguir as orientações da comissão técnica. Os gregos acertaram 62,5% dos arremessos naquela partida.

“Eu acho que o LeBron, sendo tão competitivo quanto é, teve ali o primeiro gostinho do que é representar os Estados Unidos”, disse Fran Fraschilla. “Acho que 2006 foi uma grande lição, porque o Coach K estava começando a construir uma cultura, explicando por que aquilo era importante.”

Foi um começo difícil — mas só o começo.

“O ponto principal era esse: o nosso principal jogador, LeBron, tinha passado por uma Olimpíada sem ouro. E nós também”, contou Coach K ao Sporting News. “Mas ele quis tentar de novo. LeBron se manteve firme… e quando a gente trouxe os veteranos Chauncey Billups, Jason Kidd e um cara chamado Kobe Bryant, eu me reuni com o LeBron antes do torneio e perguntei o que ele achava. E ele foi direto: ‘Claro. Quero estar com esses caras. Tenho o que aprender com eles.’”

“Na primeira reunião com o time, dissemos para eles levarem todos os egos. A gente não acreditava nessa de ‘deixe seu ego na porta’. A ideia era colocar todos os egos sob um mesmo guarda-chuva chamado Estados Unidos. Se fizéssemos isso, iríamos conquistar o mundo. Mas antes, precisávamos reconquistar o respeito do mundo — e também do nosso próprio país.”

“Criamos um conjunto de princípios que seriam seguidos dentro e fora de quadra. Todo mundo contribuiu: manter a postura, nunca mostrar fraqueza, ser flexível, estar pronto para qualquer situação, apoiar o companheiro, falar a verdade, nunca fazer um treino ruim, chegar sempre no horário… são coisas que você precisa fazer para viver em grupo. A ideia era criar senso de pertencimento. Não era o técnico mandando — era o time querendo fazer.”

“No fim das contas, eles sabiam que só iam ouvir uma pergunta: vocês ganharam?”

LeBron James

O Time da Redenção recoloca os EUA no topo

Os Estados Unidos nunca mais perderam uma Olimpíada desde então. Passaram por alguns sustos — como contra a Espanha, em 2008, 2012 e 2016, além da derrota para a França na fase de grupos dos Jogos de Tóquio-2020, vingada depois com uma atuação de 29 pontos de Kevin Durant na final. No último ciclo, a semifinal contra a Sérvia também deu trabalho.

Mas foi em Pequim, em 2008, que tudo começou a mudar de verdade. Os EUA venceram todos os cinco jogos da fase de grupos, com média de 32 pontos de vantagem. Incluindo uma vitória por 23 pontos sobre a Grécia — uma espécie de revanche pessoal de Chris Bosh, que destruiu o jogo de bloqueios dos gregos praticamente sozinho. A única partida equilibrada foi a final contra a Espanha, vencida por 11 pontos. E o núcleo daquela equipe voltou em Londres, em 2012.

“Ainda havia um reconhecimento de que o cenário internacional continuava competitivo... então a missão era mostrar que 2008 não tinha sido um raio em céu azul”, afirmou Chris Sheridan. “Foi o começo de um processo de reconstrução da dominância.”

LeBron James disputou três Olimpíadas desde que o projeto do "Redeem Team" começou — incluindo o retorno nos Jogos de Paris-2024, aos 39 anos. Naquela edição, ele liderou a equipe americana em rebotes e assistências, e foi eleito MVP do torneio.

“Pro LeBron ter voltado em 2024, sendo o nosso líder... Eu sei que o Steph Curry foi sensacional nos últimos jogos, mas o cara que nos levou ao ouro foi o LeBron James”, disse Mike Krzyzewski, que se aposentou da função de técnico da seleção após os Jogos de 2016. “Graças a Deus tivemos esse nível de comprometimento de dois dos maiores da história. O do LeBron durou mais. E isso não é uma crítica ao Michael, que provavelmente é o melhor de todos.”

“Eu fico impressionado com o comprometimento do LeBron por duas décadas. Começou em 2004 e terminou em 2024 — é inacreditável. Nos tornamos grandes amigos, e ele foi um jogador incrível de se treinar.”

Mike DeCourcy

Mike DeCourcy has been the college basketball columnist at The Sporting News since 1995. Starting with newspapers in Pittsburgh, Memphis and Cincinnati, he has written about the game for 37 years and covered 34 Final Fours. He is a member of the United States Basketball Writers Hall of Fame and is a studio analyst at the Big Ten Network and NCAA Tournament Bracket analyst for Fox Sports. He also writes frequently for TSN about soccer and the NFL. Mike was born in Pittsburgh, raised there during the City of Champions decade and graduated from Point Park University.