College Station, no Texas — conhecida como o coração de Aggieland — é uma cidade pequena que abriga a Texas A&M. Por lá, o esporte é rei: a maioria dos moradores tem alguma ligação com a universidade. Em dias de jogo de basquete, 13 mil torcedores lotam a Reed Arena para ver seus ídolos em quadra.
Enquanto os gigantes dominam o garrafão, ninguém presta muita atenção nos magrelos gandulas do ensino fundamental, especialmente aqueles com aparelho nos dentes, espinhas e franjão caindo sobre as sobrancelhas. De vez em quando eles até arriscam uns dribles durante o aquecimento, mas essa provavelmente é a maior proximidade que terão com o sonho de jogar pelos Aggies.
A não ser que você seja Alex Caruso. O sonho dele de jogar na Reed Arena nunca morreu — e sua carreira no basquete nunca parou. Ele passou pela SEC, pela G-League e chegou à NBA. Agora, disputa as Finais como peça importante do favorito Oklahoma City Thunder. Se o OKC superar o Indiana Pacers, Caruso conquistará seu segundo anel. Nada mal para o garoto local que só queria jogar em casa na universidade.
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O caminho de Alex Caruso até a Texas A&M
O pai de Caruso, Mike, foi um bom armador em Creighton. Raramente errava lances livres e vencia jogos com sua inteligência em quadra, mais do que com atributos físicos. Com 1,78m, sabia que não teria futuro como profissional. Manteve-se próximo ao esporte, trabalhando por 30 anos no departamento atlético da Texas A&M.
Seu filho do meio, Alex, cresceu ouvindo o hino dos Aggies como canção de ninar. Passou a vida em College Station sonhando em ser o próximo Acie Law.
Caruso era bom jogador na infância. Mas não era J-Mychal Reese. Reese morava na cidade vizinha, Bryan, e fazia parte da mesma classe de recrutamento. Já no 4º ano, ele aparecia nos rankings nacionais. Chegou a receber carta do técnico Lute Olson, do Arizona, no verão seguinte. Foi o melhor jogador ranqueado do país no 7º e 8º ano. Até estrelou um comercial com Steve Nash, que brincou: “J-Mychal Reese? Dei esse nome pro meu cachorro.”
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As universidades cercavam Reese já no primeiro ano do ensino médio. Caruso? Ninguém sabia quem era. Enquanto Reese e os demais astros viajavam pelos EUA em torneios da AAU, Caruso ficava em College Station, jogando com algumas centenas de garotos locais nos acampamentos de verão da A&M.
“O comentário interno era: ‘Ah, ele é jogadorzinho bom de acampamento’”, lembra Stephen.
Gentry, então coordenador de vídeo da A&M. “Ele voltava no verão seguinte e a gente já dizia: ‘Ok, talvez jogue na DII’. Depois virava: ‘Ué, não, ele é nível DI’. E no fim do ensino médio, estávamos quase em pânico: ‘Não. Ele é bom o bastante pra jogar aqui’.”
Mike Caruso costumava passar no escritório de Gentry pedindo para usar o gravador de DVD do time e enviar vídeos dos jogos do filho no colégio A&M Consolidated para faculdades. No começo, Gentry deixava. Mas com o tempo, a coisa mudou.
“Teve uma hora que eu disse: ‘Espera aí... a gente não quer mais que você envie isso’, riu Gentry.
Um estirão no fim do ensino médio mudou tudo. De repente, Caruso estava enterrando em cima de adversários, sendo convidado para acampamentos nacionais e despertando o interesse de universidades.
O relatório de olheiro do ensino médio da ESPN dizia: “Talvez seja o último cara que você olhe no aquecimento, mas seu jogo logo chamará sua atenção.”
Going through old college letters and came across this paper 😂😁👏🏻 @ACFresh21 #BabyCaruso pic.twitter.com/r4hsDebKwu
— Blair Schaefer (@Blair__Schaefer) May 25, 2016
Colorado quase tirou o garoto local da A&M. Mike Rohn, ex-assistente dos Aggies, morava a menos de um quarteirão dos Caruso. Quando Alex estava no ensino fundamental, Rohn costumava vencê-lo em disputas de 1 contra 1 no Castlegate Park, na quadra que hoje leva o nome de Caruso. Rohn lembra de um garoto magro que não fazia 20 pontos por jogo, mas fazia tudo em quadra.
“Você não avalia a força de um jogador pelo físico, mas pelo coração”, disse Rohn, contratado por Colorado antes do terceiro ano de Caruso no colégio. “E isso foi o que ele usou pra construir a carreira.”
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Rohn via coisas no jogo de Caruso que só aparecem com o tempo: os mergulhos no chão, a defesa no melhor jogador adversário, a competitividade e as provocações. Avisou o técnico Tad Boyle, de Colorado, que precisavam contratar Caruso. Eles o levaram para uma visita e fizeram uma oferta — o que ligou o alerta na comissão da A&M.
Na época, a comissão estava dividida. Metade não acreditava que dois talentos daquele nível pudessem sair da mesma cidade. Reese era um fenômeno, já comprometido com a universidade. Mas o gandula? O filho do Mike?
Bill Walker, então assistente da A&M, conhecia bem Caruso — seu filho Vince jogava com ele. Walker já tinha visto jovens de 15 anos com aparência de 20. Caruso parecia uma criança. Mas sua liderança era além da idade: levava os mais novos aos jantares do time, cobrava esforço nos treinos. Entrou num time ruim e levou o colégio a uma campanha 31–5 no último ano.
Walker era da metade que queria muito Caruso. E essa parte venceu. Colorado não conseguiu competir com o sangue bordô e branco que corria nas veias dele.

De herói da SEC a desconhecido da G-League
Mesmo depois de conseguir a bolsa, os veteranos da A&M não sabiam se Caruso estava ali só por ser o menino da cidade. Ele parecia um bobão, sempre sorrindo, cantando country e Taylor Swift. Será que jogava mesmo?
Não demorou para mudar essa impressão. Reese, que o conhecia desde as batalhas da infância, já sabia. E diz que levou menos de uma semana para os demais entenderem.
“Ele se jogava nas arquibancadas. Quando vejo isso hoje, pra mim, esse é o Caruso”, disse Reese ao Sporting News.
Me and @ACFresh21 #aggienation pic.twitter.com/OYe8NK75
— J-Mych Reese (@j_mych2x) November 11, 2011
Caruso cracked the starting lineup in the seventh game of the season. By the end of the year, he'd broken the freshman SEC record for steals.
Na sétima partida da temporada, Caruso virou titular. No fim do ano, quebrou o recorde de roubos de bola por um calouro da SEC.
Fez uma boa carreira universitária, sendo peça fundamental na virada histórica sobre a Northern Iowa em 2016 — quando a A&M tirou uma diferença de 12 pontos nos últimos 44 segundos e venceu na prorrogação.
Mesmo assim, a história se repetiu. No último ano de faculdade, teve média de 8,1 pontos por jogo. Era um grande defensor, mas... não parecia um jogador da NBA.
Ninguém se surpreendeu quando ele não foi draftado. Ganhou chance na Summer League com os 76ers, onde dividia tempo com Ben Simmons e T.J. McConnell. Sem muito brilho. Cogitava ir para a Polônia ou Alemanha. Até que o Thunder ligou, oferecendo vaga no training camp.
Caruso aceitou na hora. Foi cortado antes da temporada, mas conseguiu contrato com o time da G-League — comandado por um jovem técnico de 31 anos chamado Mark Daigneault.
Nearly a decade later, this duo went from OKC’s G League to heading into the Western Conference Finals together 🔥🏀 #TeamWass
— Wasserman Basketball (@wassbasketball) May 20, 2025
(via: @ThunderFilmRoom) pic.twitter.com/pI2brxcKRV
Caruso não teve nenhuma chamada para a NBA naquele primeiro ano. Foi apenas o 9º maior pontuador do time. Sua defesa seguia despercebida. Era o garoto ignorado do ensino médio, recomeçando do zero.
O gerente geral Sam Presti viajou com o OKC Blue durante uma excursão. Lá, alguém perguntou o que ele levava em conta para promover jogadores da G-League. Ele respondeu: “Quantas posições conseguem marcar e se são bons companheiros.”
Caruso acreditava que conseguia marcar duas posições na NBA. Sabia que era altruísta. Decidiu ficar mais forte.

Caruso conquista seu espaço na NBA
Precisou de outra Summer League — dessa vez com os Lakers — até assinar seu primeiro contrato two-way e ganhar minutos na NBA. No ano seguinte, renovou. No terceiro, teve contrato garantido, foi titular nas Finais e campeão ao lado de LeBron James.
Mesmo com o título, alguns ainda duvidavam. Os Lakers o deixaram sair na free agency para priorizar Talen Horton-Tucker.
Caruso assinou por quatro anos com os Bulls, tornando-se o 146º jogador mais bem pago da liga. Presti o observava de longe — e viu a evolução.
No verão passado, decidiu agir. Trocou Josh Giddey, ex-6ª escolha do Draft, para recontratar o jogador que um dia havia dispensado. Ao explicar a troca, lembrou sua filosofia:
“A forma como ele defende alas maiores é extraordinária”, disse Presti.
Presti sabia que Caruso agora podia marcar posições acima. Mas nem ele previa o que veria nas Finais do Oeste.
No Jogo 7 contra os Nuggets, com a temporada em jogo, Daigneault colocou o armador de 1,96m e 84 kg para marcar Nikola Jokic, de 2,11m e 129 kg. Caruso lutou por cada centímetro. Limitou o MVP a 20 pontos e forçou cinco turnovers. O Thunder venceu por 32 pontos e chegou às Finais pela segunda vez na história.
Dias depois, Stephen Gentry lembrava dessa atuação enquanto consolava a filha de 11 anos, triste por não passar em uma peneira de futebol. Contou a história de Caruso: o gandula, o crescimento tardio, a corrida própria. Ser ignorado. Trabalhar em silêncio. Chegar ao topo.
Mostrou uma foto. Ela olhou para o careca de faixa na cabeça. Pensou um pouco. E disse o que tantos já pensaram:
“Pai… ele não joga na NBA.”