Altitude no futebol: a partir de qual altura jogadores sentem efeitos?

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Um dos grandes adversários dos times brasileiros nas competições da América do Sul é a altitude. Enquanto na Bolívia, no Equador e no Peru, os jogadores e torcedores já estão acostumados, para os clubes brasileiro, disputar uma partida a mais de 2.500 metros acima do nível do mar é motivo de grande preocupação.

Afinal, até que ponto a altitude interfere no futebol? Quais os efeitos reais sobre o corpo dos jogadores? E qual a linha tênue entre o desafio físico e a desvantagem competitiva?

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Qual é a altitude que dá diferença para jogadores?

De forma geral, os primeiros efeitos da altitude são sentidos a partir de 1.500 metros. No entanto, é a partir de 2.400 metros que o corpo humano começa a demonstrar sinais mais evidentes de esforço extra: cansaço precoce, dificuldade de respiração, dor de cabeça, tontura e náuseas.

Em esportes de alta exigência física como o futebol, onde a resistência cardiovascular é testada constantemente, os efeitos se acentuam. Em locais como La Paz (3.640m), Quito (2.850m) ou Cusco (3.400m), o ar rarefeito reduz a presença de oxigênio em até 30% em relação ao nível do mar, exigindo que os atletas consumam mais energia para realizar movimentos habituais.

“A partir de 2.500 metros, já é possível observar queda de rendimento em atletas que não estão aclimatados”, explica Dr. José Kawazoe Lazzoli, cardiologista do esporte e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício.

Efeitos no corpo: o que realmente acontece?

Na altitude, o organismo precisa se adaptar a um ambiente com menos oxigênio. Isso gera o que os médicos chamam de hipóxia hipobárica – uma condição em que o corpo tem dificuldade de absorver oxigênio suficiente. Com isso:

  • O coração bate mais rápido;
  • A frequência respiratória aumenta;
  • A musculatura entra em fadiga mais rapidamente;
  • O tempo de recuperação após sprints e divididas é maior;
  • Há risco de mal-estar agudo da altitude, com sintomas semelhantes ao de uma gripe forte.

Nos primeiros dias de exposição, o corpo começa a produzir mais hemácias (glóbulos vermelhos), tentando compensar a menor oferta de oxigênio. Mas esse processo pode levar de 7 a 10 dias para surtir efeito — tempo inviável para a maioria das delegações esportivas.

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Dados em campo: desempenho comprovadamente inferior

Estudos da Fifa e da Conmebol já indicaram uma tendência clara: times que jogam acima dos 2.500 metros de altitude apresentam queda média de 15% a 20% no volume de jogo, quando comparado a atuações no nível do mar.

Em 2007, um levantamento da Universidade de Lausanne, na Suíça, analisou partidas de clubes europeus e sul-americanos em altitudes acima de 2.800 metros. O estudo concluiu que a quantidade de sprints, passes longos e finalizações de fora da área cai significativamente, enquanto o número de faltas e cartões aumenta — resultado da dificuldade de acompanhar o ritmo do jogo.

“O jogador não consegue manter o mesmo nível de intensidade. É como se o corpo não acompanhasse o raciocínio do atleta”, afirma Fernando Signorini, preparador físico argentino que já trabalhou com Diego Maradona e Lionel Messi.

Adaptação ou sofrimento? O que os clubes fazem para amenizar os efeitos

Com pouco tempo para se aclimatar, a maioria das equipes opta por estratégias emergenciais, como:

  • Chegar poucas horas antes do jogo, tentando evitar o tempo necessário para o corpo “sentir” a altitude;

  • Câmaras hiperbáricas e treinos simulados em altitude artificial, em centros de excelência;

  • Hidratação intensa, suplementação com ferro e medicamentos vasodilatadores (como a acetazolamida, em alguns casos);

  • Controle rigoroso da alimentação e do sono nos dias que antecedem a partida.

“Nada substitui a aclimatação. Mas como isso não é possível na prática, o foco é minimizar os danos”, explica o fisiologista Ricardo Sasaki.

A polêmica da altitude: desvantagem natural ou injustiça esportiva?

O debate já foi parar na FIFA. Em 2007, a entidade chegou a proibir jogos acima de 2.500 metros, o que gerou revolta em países andinos. A decisão foi revogada meses depois, com o argumento de que a altitude era parte da geografia natural dos países — assim como o calor no Nordeste brasileiro ou o frio no sul da Argentina.

“Se vamos reclamar da altitude, também deveríamos proibir jogos ao meio-dia em Cuiabá ou em gramados sintéticos”, ironizou à época o então presidente da Bolívia, Evo Morales.

Casos emblemáticos: quando a altitude virou protagonista

  • Bolívia 2 x 0 Brasil – Eliminatórias da Copa de 1994 (La Paz, Bolívia – 3.640m)
    Data: 25/07/1993 – A primeira derrota do Brasil na história das Eliminatórias. A Seleção de Carlos Alberto Parreira sofreu fisicamente. Zinho passou mal em campo e Cafu teve queda de rendimento. A derrota escancarou os efeitos da altitude.

  • Real Potosí-BOL 2 x 2 Flamengo – Libertadores 2007 (Potosí, Bolívia – 4.067m)
    Data: 14/02/2007 – O Flamengo sentiu fortemente os efeitos da altitude extrema. O time mal conseguia trocar passes e saiu perdendo por 2 a 0. Renato Abreu precisou usar cilindro de oxigênio à beira do gramado, símbolo do desgaste. Com muita dedicação, o Fla ainda buscou o empate.

  • LDU-EQU 4 x 2 Fluminense – Final da Libertadores 2008 (Quito, Equador – 2.850m)
    Data: 25/06/2008 – Na primeira partida da final, o Fluminense foi dominado. Washington perdeu fôlego, Thiago Neves pouco criou, e a LDU construiu a vantagem que levaria ao título nos pênaltis, mesmo perdendo por 3 a 1, no Maracanã, na volta.

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Conclusão: futebol na altitude ainda é um desafio concreto

A ciência é clara: a altitude afeta, sim, o rendimento dos jogadores. Mas a forma como os clubes e federações lidam com isso varia. Para os times que vivem acima dos 2.500 metros, trata-se de uma vantagem natural e legítima. Para os visitantes, é preciso planejamento e inteligência tática para superar o desafio extra em campo.

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