O jornalista Jorge Nicola revelou nesta segunda-feira (18/8) que a disputa jurídica envolvendo John Textor e os sócios da Eagle Football Holdings abriu espaço para novas possibilidades em relação ao futuro da SAF do Botafogo. Entre os interessados, chama atenção a presença do filho de um "rei" (emir) de um dos emirados dos Emirados Árabes Unidos. Além do príncipe árabe, também aparecem na lista de interessados um grupo empresarial italiano e o banqueiro brasileiro Juca Abdalla, conhecido por sua longa atuação no mercado financeiro e por deter participações relevantes em empresas como Petrobras, Eletrobras e Cemig.
De acordo com Nicola, as chances de Textor recuperar o controle do Botafogo diminuem a cada dia, principalmente pela deterioração de sua relação com o fundo Ares Management, que tem peso decisivo nas negociações. Diante da instabilidade, o próprio clube associativo já admite a necessidade de novos investidores para evitar maiores prejuízos. Uma fonte ligada ao clube afirmou ao jornalista:
– O Botafogo é um patrimônio valioso e desperta o olhar de muita gente. Não vamos ser prejudicados por disputas entre sócios internacionais e também não ficaremos reféns de banqueiros estrangeiros que só querem explorar o clube.
Como funciona a monarquia dos Emirados Árabes Unidos
Não existe “um rei dos Emirados”. Os Emirados Árabes Unidos (EAU) são uma federação de sete monarquias hereditárias (emirados): Abu Dhabi, Dubai, Sharjah, Ajman, Umm Al Quwain, Ras Al Khaimah e Fujairah. Cada um é governado por um emir (sheikh). No nível federal, o órgão máximo é o Conselho Supremo Federal, formado pelos sete governantes. Cada emirado tem um voto e o Conselho define políticas nacionais, sanciona leis federais e elege o Presidente e o Vice-Presidente do país.
Presidência e premiê: por tradição, o Presidente costuma ser o governante de Abu Dhabi e o Primeiro-Ministro/Vice-Presidente, o governante de Dubai — mas a prática não escrita em lei. Mandatos presidenciais são de cinco anos, com reeleição possível.
Quem governa hoje
Presidente dos EAU (desde maio de 2022) e Emir de Abu Dhabi: Mohamed bin Zayed Al Nahyan (MBZ).
Vice-Presidente 1, Primeiro-Ministro e Emir de Dubai: Mohammed bin Rashid Al Maktoum (MBR) [na foto da matéria]
Vice-Presidente 2: Mansour bin Zayed Al Nahyan
Demais emires: Sharjah (Sultan bin Muhammad Al Qasimi), Ajman (Humaid bin Rashid Al Nuaimi III), Umm Al Quwain (Saud bin Rashid Al Mu’alla), Ras Al Khaimah (Saud bin Saqr Al Qasimi) e Fujairah (Hamad bin Mohammed Al Sharqi).
O potencial comprador da SAF do Botafogo seria filho de um destes nomes.
Fortuna: pessoal x estatal
Falar em “patrimônio pessoal” de monarcas do Golfo é especulativo; a riqueza relevante está em fundos e holdings estatais (ou paraestatais) controlados pelos emirados, sobretudo Abu Dhabi e Dubai:
Abu Dhabi (EAU federal)
ADIA (Abu Dhabi Investment Authority): um dos maiores fundos soberanos do mundo; estimativas recentes colocam o ADIA acima de 1 trilhão de dólares em ativos sob gestão.
Mubadala e ADQ: grandes investidores globais (infraestrutura, tecnologia, saúde, energia). Sheikh Tahnoun bin Zayed, irmão de MBZ, preside/está ligado a parte desse ecossistema e ao conglomerado IHC.
Dubai
ICD (Investment Corporation of Dubai): holding estatal do Emirado, declara 1,4 trilhão de dólares em ativos.
Dubai Holding, Dubai Duty Free e empresas como DP World (portos/logística) compõem a teia econômica de Dubai. (DP World é peça central em patrocínios esportivos, abaixo.)
Em resumo: a “fortuna” das famílias se expressa via fundos soberanos e holdings — instrumentos que financiam política industrial, soft power e megaeventos.
Interesse dos Emirados Árabes Unidos em esportes
Os EAU usam o esporte para atrair turismo, projetar imagem internacional, diversificar a economia e apoiar objetivos industriais (aviação, logística, tecnologia).
Veja esportes que recebem investimentos dos Emirados:
1) Futebol
Manchester City / City Football Group (CFG): controlado pela Abu Dhabi United Group, do sheikh Mansour bin Zayed (Vice-Presidente dos EAU); o CFG tem participação de investidores como a americana Silver Lake (que detém 14,5% do grupo). A Etihad Airways (Abu Dhabi) patrocina o Manchester City e dá nome ao estádio do clube.
No Brasil, o Grupo City é dono da SAF do Bahia. Assim, podemos eliminar que familiares dos irmãos Mohamed bin Zayed e Mansour bin Zayed estejam interessados no Botafogo.
Abu Dhabi tem compromisso com o Bahia, mas os outros emirados (incluindo Dubai) ainda podem fazer investimentos no Brasil. No entanto, Dubai não apresenta histórico no futebol.
2) Hipismo de elite
Godolphin e Dubai World Cup: criados e conduzidos por MBR (Dubai), transformaram o Emirado em potência de turfe e criador de cavalos puro-sangue. (Torneio e operação estável com presença global.)
3) Lutas, jiu-jitsu e UFC
ADCC (Abu Dhabi Combat Club) e o crescimento do jiu-jitsu no país têm como patrono Sheikh Tahnoun bin Zayed; o ADCC é “as Olimpíadas do grappling” e começou em 1998.
UFC em Abu Dhabi: parceria de longo prazo com o Departamento de Cultura e Turismo de Abu Dhabi (múltiplos eventos desde 2010; renovada nos últimos anos).
4) Fórmula 1 e automobilismo
GP de Abu Dhabi (Yas Marina): etapa final da F1 desde 2009; Etihad é patrocinadora-título “por mais de uma década”. O evento ancora turismo premium e ativações de marcas locais (bancos, aviação, entretenimento).
5) Golfe e tênis
DP World Tour: a antiga European Tour foi renomeada em 2022 após acordo de patrocínio com a DP World (Dubai). A parceria ampliou prêmios e presença global do circuito.
Dubai Duty Free Tennis Championships (ATP 500 / WTA 1000): torneio de alto nível desde os anos 1990, com apoio de estatais/holdings de Dubai.
Como as decisões são tomadas
No nível federal, o Conselho Supremo (os sete emires) define diretrizes. A Presidência (MBZ) tem forte peso na política externa/segurança e no alinhamento dos grandes fundos.
Cada emirado tem suas prioridades e marcas-âncora (ex.: Abu Dhabi com aviação/F1/City Football Group/jiu-jitsu; Dubai com turismo global/hipismo/tênis/golfe). A coordenação acontece por meio de conselhos econômicos e holdings controladas pelas famílias reinantes.
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